quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Eles não sabem, nem sonham!

A decisão foi nossa... não foi tua, não foi minha, foi nossa! Pensada, refletida, chorada! Fez-nos perder noites de sono. Levantou uma parede de silêncio entre nós feita de perda e revolta. Calei-me, calaste-te... calamo-nos! Digerimos a decisão, com sofrimento, com desprezo... Eu procurei encontrar outras soluções. Confesso que, lá no fundo o meu coração procurou sempre uma luz ao fundo do túnel, uma solução milagrosa que me fizesse acordar deste pesadelo... mas não, não acordei, e desde então, conto bem mais de 365 dias, vivo no limbo.
Tivemos que dizer-lhes. 
Ele era demasiado pequeno para entender exatamente as consequências da nossa decisão, para ele o papá passou a viver numa casa na Argélia e vir à nossa de vez em quando. Começou a ver o pai através de um pequeno retângulo mágico, falava com ele, enviava beijinhos repenicados mas não lhe sentia o abraço. Sabíamos que a maior dificuldade seria explicar-lhe a ela. Fazê-la entender o porquê desta necessidade de nos separarmos geograficamente mas não no coração, nas vontades, nas decisões, nas vivências, na partilha. Foi difícil, muito difícil. Dos seus quase seis anos tivemos que a fazer entender que o pai continuaria a ser nosso, que continuaremos a ser família, e que jamais isso seria diferente. Chorou! Sim, chorou muito! Disfarçou o choro! Tentou ser mais crescida do que devia! Podia ter chorado sem esconder o rosto, sem disfarçar o beicinho, sem limitar as lágrimas sentidas que dos seus lindos olhos insistiam brotar. Sofreu! Sofreu muito! Com ela sofremos nós também. Com uma dor ainda maior que a dela, porque no nosso coração estava já alojada uma dor enorme - a dor da decisão!
Para nós esta não foi uma hipótese, não nos fez sonhar com casas à beira-mar ou viagens de sonho todos os anos. Para nós o sim, tão sofregamente revelado aos nossos filhos, escreveu-se com letra maiúscula e serigrafada, tem nomes próprios e vale por dois. Tão diferente do que é para eles! Um nome comum, que se sente, que se escreve em português e se ouve tantas vezes no fado, nome de perda, nome de saudade.
Passou-se quase um ano e meio e a dor continua... em mim, em ti, e nela. É uma dor que não se ultrapassa, vivida diariamente, que nos esgota até à exaustão, que horas nos ergue e horas nos leva ao fundo do mais profundo poço.
Hoje o som da minha gargalhadas é quase uma lembrança. Só os nossos filhos me fazem rir e resistir à vontade de tantas vezes chorar. Hoje, não olho o mundo com olhos de ver, como poderia?! Um mundo que obriga famílias a separem-se não pode ter a pretensão de ser apreciado. 
Sofro ainda muito, sim é verdade! Sofro com ela, nas angústias e nas alegrias de que não participas, sofro cada vez mais também com ele, que da sua pequenez já diz ter saudades do pai.
Não imagino a dor de quem parte, mas sei bem o sentimento de perda de quem fica! Sou eu que estou aqui e passo as mãos pela cabeça, que dou colo, que dou mimo por mim e por ti, que dou xarope quando a febre ou a tosse quer vencer, e preparo o biberão a meio da noite para compensar o mimo que lhes falta. Sou eu que estou aqui a educar, a orientar, a dar ralhetes quando é preciso... a pôr ordem na nossa casa que sem ti é menos acolhedora e mais fria. 
Há dias em que o sol parece querer romper por entre 50 sombras de cinzento, mas há difíceis... muito difíceis... dias em que todas as palavras sábias do mundo não são suficientes para dar resposta à perspicácia de uma criança. 
"Saiba que são suas decisões, e não suas condições, que determinam seu destino". Anthony Robbins

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