sexta-feira, 26 de julho de 2013

Recordar é viver!

Recordo-vos com saudade, com ternura, com um gemido sentido e mudo. 
Recordo momentos a preto e branco desgastados pelo tempo; ouço risadas estridentes mas que mais ninguém ouve e me fazem suspirar de saudade.
Recordo feições que se desvanecem; cabelos brancos; pernas imaculadamente brancas que o tempo não fustigou; corpos esqueléticos e fragilizados que gostava de puder curar; olhares tristes por onde restos de vida se esgueiram sem pedir licença.
Recordo o cheiro da mistura de Colónia Ach. Brito e Restaurador Olex; as faces rosadas de Tokalon; um colar de pérolas que tem o peso de histórias; o cheiro a pão quentinho onde a manteiga se derrete e o bafo quente do chã preto que sopra de uma chávena em porcelana rosada.
Recordo pássaros e passarinhos e umas mãos grossas, calejadas pelo trabalho, que delicadamente os alimenta e os mima; camélias... brancas, rosa e vermelhas que peneirentas espreitam da árvore e amarelecem no chão; grãos de milho que caem no chão enlameado e são depenicados vorazmente por bicos esfomeados.
Recordo beijos e abraços; tardes de choro no sofã com as faces rosadas e inchadas que encontram conforto num colo que cheira a sabão rosa, umas mãos que me afagam a cabeça e uma voz que reza a um qualquer santo pedindo clementemente que afaste da "minha menina" dores e maleitas.
Recordo dias de verão; o som dos travões de um autocarro que corremos para não perder, uma cesta de picnic, uma garrafa termos que se abre e que faz sair uma nuvem com cheirinho a cevada, e risadas de criança que saltam na água gélida do mar sob os olhos vigilantes de um rosto de amor. 
Recordo o som da colher que toca no caneco de inox e faz agitar o refresco de cevada... doce... fresco... bebido de uma só golada!
Recordo umas mãos de senhorinha, já enrugadas mas sempre impecavelmente tratadas, que se agitam num movimento forte e amassam e peneiram e fazem o sinal da cruz; um avental enfarinhado de folhos e tecido de chita; o cheiro a pão acabado de cozer e o estalar da folha de couve que se quebra.
Recordo os olhos de um azul-esverdeado ciumento que esconde amarguras e segredos; baralhos de cartas e fotos antigas amareladas pelo tempo; corpos caídos no chão que pedem socorro e desistem de lutar; lágrimas profundas que deslizam por um rosto velhinho, que acaricio com a alma porque receio que a minha mão trema e o meu coração salte.
Recordo sons, gestos, cheiros, imagens... da vida deles, da minha vida, das nossas vidas e da vida de tantos outros. Recordo porque recordar é viver e ao recordar, transformo-me num mágico que numa esperança louca tenta um truque de magia capaz de fazer tudo voltar à vida.





p.s. aos meus avós que tiveram especial papel na minha vida e, em especial, aos avós dos meus filhos a quem um dia eles deverão recordações como as minhas e a quem eu devo apenas TUDO!

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